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13/11/2020
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STF)
Avó de duas crianças conseguiu habeas corpus para ir para prisão domiciliar por deter a guarda dos netos. A decisão é do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal – STF, que deferiu o HC 192.800. O entendimento é de que a medida é admitida quando o acusado ou réu for imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 anos ou com deficiência. Acusada de tráfico e sem outros registros criminais, a mulher será que comparecer periodicamente em juízo para informar e justificar suas atividades. Ela foi presa em setembro por determinação da Primeira Vara Criminal da Comarca de Santa Bárbara d’Oeste, no interior de São Paulo, e teve pedidos de liminar negados no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – TJSP e no Superior Tribunal de Justiça – STJ. As crianças, uma de 3 e outra com 6 anos de idade, são dependentes da avó. A mãe delas faleceu em 2018, e o pai, que cumpre medidas cautelares, não tem condições de cuidar dos filhos. Além disso, a avó é viúva e tem uma filha de 17 anos, ou seja, também menor de idade. Constrangimento ilegal Para Gilmar Mendes, mesmo diante da dupla supressão de instância, que, em tese, impediria o conhecimento do pedido da defesa pelo STF, o caso é de constrangimento ilegal, que permite a superação do entendimento do Supremo sobre a matéria. A prisão domiciliar só será mantida se a mulher cumprir os seguintes requisitos: solicitar previamente autorização judicial sempre que pretender se ausentar de sua residência; atender aos chamamentos judiciais; noticiar eventual transferência; e, por fim, submeter-se, periodicamente, juntamente com sua família, a estudos psíquico-sociais, para que a situação das crianças seja monitorada. O ministro destacou os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e a proteção da maternidade, da infância e da família. Além disso, a Lei de Execução Penal (7.210/1984) assegura condições mínimas de assistência às mães presas, inclusive as que estão em regime provisório, e aos recém-nascidos. Proteção da primeira infância Mendes citou ainda o Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016), que, por sua vez, ampliou as hipóteses de concessão de prisão domiciliar para as situações em que o acusado ou o réu for “imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de seis anos de idade ou com deficiência”. O ministro ressaltou a necessidade de aplicação dessa norma “de forma restrita e diligente, verificando-se as peculiaridades de cada caso”. A jurisprudência caminha no mesmo sentido, a exemplo do julgamento do HC 143.641, em que a Segunda Turma do STF permitiu a substituição da prisão preventiva pela domiciliar a gestantes e mães de filhos com até 12 anos, quando forem as únicas responsáveis pela tutela das crianças. No entanto, naquele julgamento, foram ressalvados os crimes cometidos com violência ou grave ameaça contra os descendentes e situações excepcionais, devidamente fundamentadas pelo juiz da causa. O ministro frisou ainda que, no âmbito internacional, as Regras de Bangkok, de 2010, asseguram que a adoção de medidas não privativas de liberdade deve ter preferência no caso de grávidas e mulheres com filhos dependentes. Olhar diferenciado e humanizado Para a advogada Alessandra Muniz, segunda vice-presidente da Comissão dos Direitos da Pessoa Idosa do Instituto Brasileiro de Direito - IBDFAM, a decisão foi acertada. Ela frisa que o ministro atendeu o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e a proteção da maternidade, da infância e da família, conforme o Marco Legal da Primeira Infância. “Essas decisões que trazem um olhar diferenciado e mais humanizado, segundo meu entendimento, vêm ao encontro do que preconiza nosso IBDFAM. Mas claro, por óbvio, que há de ser analisado caso a caso de uma forma restrita e diligente”, destaca Alessandra. Novo lugar das pessoas idosas nas famílias De acordo com a advogada, a realidade dos avós no seio familiar brasileiro foi alterada significativamente, principalmente com a mudança estrutural da família no século XXI. Vários fatores explicam a realidade de tantas crianças e adolescentes que têm os avós como únicos ou principais responsáveis. “Temos que nos ater a dois grupos de idosos: o primeiro que é o provedor da família, que detém o poder financeiro; outro é o que cuida de seus netos para que os pais destes possam trabalhar e levar o sustento ao lar”, difere Alessandra. Ela acrescenta: “Ocorre que, diante de uma responsabilidade maior sobre os netos, os avós, na minha opinião, deixaram de viver o verdadeiro sentido do termo avô ou avó. São tantas responsabilidades que muitos podem ter uma crise de identidade na avosidade”. Longevidade e qualidade de vida O aumento da longevidade e da qualidade de vida provocou um novo cenário nos lares brasileiros, marcado também por novos conflitos. “Dentro dessas mudanças, muitos idosos recebem apoio e carinho, mas, infelizmente, há alguns que sofrem todo o tipo de violência possível. Precisamos enfrentar e ajudar a mudar esse quadro”, afirma a advogada. Ela finaliza com uma frase da juíza Andréa Pachá, diretora nacional do IBDFAM: “O envelhecimento tem ganhos, perdas e contradições. Temos que saber quem são essas pessoas de quem estamos tirando a voz”.
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